domingo, 12 de dezembro de 2010

Maurício Arruda Mendonça I


Nascido em Londrina (PR) há 39 anos, o dramaturgo, poeta e tradutor Maurício Arruda Mendonça vem construindo, nas últimas duas décadas, uma obra contundente e instigante, que transita com desenvoltura pela poesia, teatro e tradução.

Você vem atuando em áreas, que vão da tradução à dramaturgia.
Qual a influência que esses dois tipos de escrita têm na sua poesia?

A tradução me deu consciência da lapidação mais rica do verso, da busca de imagens, de ritmos, de uma certa clareza de pensamento. A tradução permite algo único: o contato direto com os procedimentos “secretos” do poeta, seus recursos técnicos e emocionais. Poder mergulhar na obra e vida de um Rimbaud ou de uma Sylvia Plath, por exemplo, é algo enriquecedor. A tradução é um espaço fértil do pensar e do escrever. Existe uma poesia da palavra, que é importante. Mas existe a poesia do gesto teatral que me fascina igualmente.

"Pra mim importa falar da experiência vivida, do nosso estar no mundo. E busco alcançar isso tanto numa peça como num poema, ou mesmo na própria escolha de um poeta ou escritor para traduzir".


Como se deu essa passagem da poesia para o teatro?

Em 1995 fui convidado pelo diretor Paulo de Moraes para trabalhar numa versão de Édipo Rei de Sófocles. Estão quis experimentar a idéia da poesia em ação. Acho que em Édipo consegui uma dramaturgia com poesia crua, com sangue, dotada de uma clareza leminskiana. Daí em diante mergulhei no estudo não só da dramaturgia, mas também da arte do ator, arte dos clowns e palhaços. E dirigi algumas peças, que é uma coisa que sempre quis fazer. Esse convívio diário com o teatro me fez transcender a escrita literária. Hoje posso criar uma dramaturgia para um pantomima ou um texto para ser falado. São opções expressivas que tenho a disposição. Por outro lado, não deixo de utilizar referências literárias nos textos teatrais, pois me preocupo muito com a qualidade da mensagem que estou passando para as pessoas.

Neste semestre, três peças suas estiveram simultaneamente em cartaz em São Paulo: Kerouac, Pessoas Invisíveis, inspirada nos quadrinhos de Will Eisner, e Casca de Noz. O que há em comum ou de diferente nesses trabalhos?

Kerouac foi um desafio, por se tratar da dramaturgia de um monólogo. Mas o prazer foi colocar a pessoa, a existência de Jack Kerouac, trágica e contraditória, em ação, pois acredito que o teatro seja a maneira de trazer pessoas e fatos de volta à vida na eternidade do momento presente.Havia também um ranço na imprensa e de certos críticos de achar que Kerouac um escritor menor. Acho que conseguimos, através do teatro, lançar luzes sobre ele e reverter essa visão equivocada. Muita pessoas que não conhecia Kerouac saíram de lá emocionadas e querendo conhecer seus livros. Já Pessoas Invisíveis foi inspirada na obra do grande Will Eisner. Eu estava envolvido diretamente com a narrativa de iídiche, que é uma forma de contar uma historia formulando perguntas, apresentando respostas, em ritmos variáveis. Uma forma de exposição propícia para retratar fatos muito dramáticos, com um humor patético. É uma peça muito triste. Quanto a adaptação de quadrinhos para o teatro, vejo mais esta transposição no trabalho físico e vocal dos atores e na cenografia. No que se refere o texto penso na arquitetura da história, seus quatro atos, seus cortes de tempo, e nos diálogos que nascem de imagens. Já Casca de Noz foi uma adaptação de cosmicômicas de Ítalo Calvino. Paulo de Moraes, que é sempre um diretor inspirado, conseguiu fazer um espetáculo em que os atores são como “crianças brincando”, como diria Giorgio Strehler. Na dramaturgia tentei dialogar com o humor macarrônico de Calvino que projeta toda sua verve tão inusitado com as teorias da Cosmologia.

"Aproveitei a oportunidade para pensar sobre questões que a ciência ainda tem dúvidas: O que é o tempo? Qual o papel da inteligência humana na evolução do universo? No geral, em meu trabalho dramatúrgico adoro pesquisar muito antes de redigir os textos. Gosto de trazer referências históricas, filosóficas, psiquiátricas até. Penso em termos de uma “erudição compreensível”, conteúdo densos que cheguem de maneira clara ao público. Não quero ser superficial".

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