A festa aconteceu numa casa, possivelmente a minha. Meia luz, na vitrola um tema de bossa-jazz, dos anos 50, "agua de beber" cantado por uma gringa, na capa do disco estava escrito, Janet Seidel - The art of Lounge, mas eu nunca tinha ouvido isso antes.
Pessoas rindo, se cortejando, o que festejavam eu näo sei, algo que eu fiz, ou por eu ter retornado, talvez, näo sei. Ao adentrar a sala, todos os olhares me percorreram, as cinco ou seis rodas de conversas, passaram a me olhar, na espera de um comprimento. E assim fui eu, percorrendo as rodas de amigos, eu sabia onde eu queria chegar, só uma pessoa nessa festa me interessava.
Ela estava do meu lado esquerdo, perto da porta de entrada mesmo, eu tinha que percorrer todo o caminho pra tentar chegar nela novamente. Enquanto todos me olhavam, eu ia vagando comprimentos suaves, sem muita demora, pois meu pensamento estava em apenas chegar nela, ela que estava linda, e também a minha espera. tínhamos contas pendentes para acertar. O fim do nosso relacionamento havia sido traumático ,porém, maduro. Näo tivemos chance de discutir o porque, Nem queríamos, apenas nos deixamos fluir nosso desencontro, assim como o baläo escapa de uma menina no parque de diversöes.
Quando eu estou no fim do último grupo de amigos, me deparo com outra pessoa, que também tinha contas. Essa por sua vez, sabia da minha intençäo, e de minha pressa. Ao passar politicamente saudando a todos, essa outra, me segura pelo braço, e exige um comprimento diferenciado, mais demorado. A atençäo que estava reservada, agora estava sendo saqueada. Em nenhum momento eu pensei em entregar fácil essa atençäo e a defendi com todas as minhas forças. Nessa noite eu sabia exatamente onde eu queria estar.
Do meu lado esquerdo, ainda estava ela, solene a me observar, apenas percebendo minha reaçäo diante da saqueadora de atençöes alheias, uma oportunista cheia de boas intençöes, que de täo boa te desarma. Ela era uma boa moça. Mas sempre soube que dentro de sua bondade havia armadilhas e correntes.
Olhares se cruzam sem parar, enquanto alguns ainda esperam meus comprimentos, apenas três pessoas sabiam apenas com olhares o que se passava nessas nossas cabeças cheias de intençöes.
Como um bom moço polido, consegui me livrar dessa boa moça que me prendia, dei uma desculpa qualquer, e sai, pedi lincença e fui em direçäo a Ela. Ela que observava quieta, estava linda, toda comportada, paciente, sem fazer movimentos largos, ela segurava sua taça de vinho, eperando um último gole que restava. Toda de vermelho e com cabelos cacheados ela rodava a taça e seu fiapo de vinho tinto, como uma gata em suas poses de charme que se poe sonolenta, adormecida mas ainda balança levemente o rabo, para dar um sinal de que ainda se esta atenta a qualquer movimento.
Meu sorriso se abriu ao me desvencilhar da boa moça, agora eu caminhava em direçäo a moça perigosa, a donzela misteriosa, aguardávamos o acerto de contas.
Me aproximo dela, ela fica em pé pra me receber, entäo atravéz de nossos olhares se fez notório que no nosso peito estava a bater de forma contagiante todos os tambores de uma escola de samba inteira esta a festejar o título de carnaval do ano.
Entäo eu abraço ela bem forte, bem apertado, e assim ela me retribui,
A festa segue radiante, desapercebida, eu ainda comprimentando abraçado começo a falar ao pé do ouvido o quanto eu estava feliz em reve-la, e o quanto eu desejava naquele momento conversar com ela e dizer tantas coisas que näo disse, por medo, por manobras que eu julgava täo necessárias, jogos de estratégias, defesas, ... ou por simplesmente ter me entregue ao vazio, ao acaso dos fatos em sua total liberdade.
Ela também se poe muito feliz e segue me ouvindo. Quieta recebe o meu abraço.
Ainda em pé, eu dou uma suave virada de cabeça sobre meus ombros e vejo a boa moça com olhar triste, mas ainda brilhante, me observava como que ja soubera que suas redes de bondade já näo funcionara, Ainda sim ela segue disfarçando numa conversa entre amigos.
A festa continuava com suas luzes diminutas, a música os murmuros de conversa vindo dos amigos pareciam nem tomar o conhecimento de que o universo naquele instante estava
rodando mais lento pra nós, isso tudo recriou o ambiente perfeito para continuar falando sem ser notado.
Sentamos no sofá de canto em meio a pessoas ainda em pé,
Entäo continuei a dizer coisas em seu ouvido.
Como numa longa saudaçäo de pessoas que se volvem após 20 anos de separaçäo.
Seguimos satisfeitos apenas por conversar.
Depois de algum tempo, eu percebi que as duas moças eram a mesma pessoa.
A "boa moça" era a moça com quem eu estive.
A outra "ELA" é moça como supostamente ela se encontra hoje.
Sonho 26/12/11.